Vivemos uma encruzilhada de perplexidade e de pasmo nesse momento da história do Ocidente, ou de nosso ocidentalizado planeta. Chegamos mais uma vez, dessa vez de modo mais intenso que nas demais, ao momento de seguir em frente e decidir por uma direção. Isso não é novo na história humana, muitas vezes já estivemos aí.
Várias dessas vezes, civilizações, povos e nações tomaram o rumo errado que acabou em auto-destruição, tragédia, morte e extinção. Culturas se perderam e hoje seus vestígios são motivo de visitas a museus e sítios arqueológicos. Outras, infelizmente em menor número, tomaram direções por vezes menos glamourosas, menos evidentes, mas que lhes permitiu continuar. E mesmo dentro de histórias onde uma segunda chance foi desperdiçada, vemos momentos em que anteriormente se soube mudar a maneira de pensar e mudar a rota de colisão.
Seja em que campo for: economia, meio ambiente, família, mobilidade, artes, pobreza e riqueza, ensino e aprendizagem, política, em qualquer campo, os sinais de degradação e o cheiro putrefato de decomposição se fazem notar. Diante desse quadro alguns se perguntam e projetam como pode vir a ser o futuro, como superar o momento presente e criar um novo, como administrar de modo a perpetuar e permitir a continuidade de nosso estilo de vida moderno e ocidental. Em quase todas as propostas tem-se a sensação de que se re-inventa a roda, ou que se gastam energia e recursos imensos na intenção de tentar fazê-lo, ainda que de forma magicamente diferente. Tudo no entanto, num aparente esforço vão, ou numa fé cega de que os velhos deuses modernos (o pensamento científico, a tecnologia e a sociedade administrada) – uma santíssima trindade capenga – conseguirão dar conta do Leviatã que eles mesmos criaram, promovendo uma mágica reversão de si mesmos. Fé que se traduz em crença absurda e patética de que as coisas são assim e, por desconhecimento histórico, sempre serão.
Como conseqüência de tudo isso, vemos uma sociedade sem repouso, exausta, de gente cansada de trânsito, contas, correria e produção e que para buscar descanso se mete em mais diversão, correria, vaidade e viagens, em mais atividade e televisão, barulho e agitação, que por fim provocam mais cansaço.
No meio de tudo isso, salta um profeta - Jeremias - que nos chama a pensar:
“Ponham-se nas encruzilhadas e olhem; perguntem pelos caminhos antigos, perguntem pelo bom caminho. Sigam-no e acharão descanso. Mas vocês disseram: 'Não seguiremos!' ” Jer. 6:16
A tendência natural do ser humano é, diante do cansaço e do perigo, ao invés de colocar limites, tentar se anabolizar, ganhar mais energia, aumentar a velocidade e se fortalecer. Ao invés de menos, mais, ao invés da reflexão, diversão, ao invés da suavidade mais brutalidade.
A recomendação escrita pelo profeta nos chama a atenção para possíveis saídas da encruzilhada: Pare, olhe, pergunte, siga. Tudo ao contrário do que nos é proposto pelo sistema: continue, foque, proponha, lidere.
No momento em que vivemos, estou convencido, pelas palavras que leio e pelo exemplo da história, de que neste texto temos inclusive a orientação do onde buscar a orientação e saída: nas bases tradicionais que nos antecederam, nos avós, na memória retida entre aqueles que se mantiveram relativamente à parte da modernidade.
Enquanto nossa loucura conseguiu gerar riqueza antes inimaginável e destruição em escala inédita que nos colocaram na encruzilhada em menos de 60 anos de escalada global, e em 200 anos de progresso e Laizes Faire - de forma mais localizada no ocidente -, populações e culturas integradas com a criação e nas quais o tripé formado pelos princípios do acolhimento dos limites, da escolha pela renúncia e da concepção do sagrado são nutridos e mantidos tem se sustentado vivas, mesmo diante da agressão e da cooptação moderna, por muito mais tempo, por séculos e milênios, demonstrando possibilidades para as quais tentamos sem sucesso outras saídas que não consideram a possibilidade de abraçar estes princípios.
Sendo assim, em diálogo com o momento que vivemos e com as escrituras antigas, creio que podemos encontrar saídas, desistindo de inventar à frente, mas abrindo um diálogo com o passado, que ao mesmo que não nega as contribuições modernas, as relativiza e retira seu caráter de inevitabilidade.
O texto nos dá pistas do que fazer:
Ponha-se. Ou seja, pare. Sem parar o rítmo frenético, estaremos na situação de trocar um pneu com o carro andando. Se queremos ter um futuro, o primeiro passo é declarar uma moratória, que na impossibilidade de ser global, poderia ao menos ser pessoal ou comunitária.
Na encruzilhada. Além de parar é importante que nos permitamos dar conta da própria existência da encruzilhada. No nosso caso, deixar de negar o dilema, a crise e o momento e dar-se conta de estar sem rumo de um lado, mas da existência da possibilidade do outro. Ou seja, essa encruzilhada é formada pela consciência do mal existente, mas também da possibilidade da esperança, da imaginação de como poderia ser.
Como não temos ciência de como realizar esse poderia ser, somos chamados a mais um passo.
Como não temos ciência de como realizar esse poderia ser, somos chamados a mais um passo.
Perguntem. O passo fundamental é assumir nossa ignorância e postarmo-nos como aprendizes, como incertos, como não sabedores. A solução aparece para quem assume que tem um problema, não para quem o nega, e para aquele que diante do problema sabe humilhar-se a ponto de perguntar pela solução àqueles que o antecederam.
Pelos caminhos antigos. Quanto mais voltarmos, mais chances de nos posicionarmos adequadamente. Podemos voltar aos avós com humildade, à história do ocidente, às bases sociais tradicionais, ao conhecimento antigo. No entanto, o mais importante seja o caminho mais antigo, relatado no mais antigo texto do ocidente. É voltar ao caminho da relação de confiança na qual nós seres humanos confiávamos e Deus nos confiava o cuidado da criação. O caminho mais antigo, e há mais tempo abandonado, é o caminho da confiança. Confiança de que do jeito de Deus é melhor, de que Ele não está aí para tolher ou tornar nossa vida mais infeliz, de que Ele nos propôs uma parceria, onde nós vivemos e cuidamos e Ele nos mostra o que é bom, verdadeiro, justo e melhor, e nos avisa do que é falso, ruim, injusto e pior. Na prática isso se dá em conversa com os que nos antecederam, os que estão vivos ainda, e os que deixaram seus registros nos livros. Está em observá-los, em nutrir esquecidas artes e habilidades, em abrir mão de tudo que se pode, em prol do que é melhor. Em suma, é entender que o caminho para frente, é um caminho de volta.
Perguntem pelo Bom Caminho. Ser antigo não é o único critério. Houve caminhos antigos que deram em nada, ou em desastre ou em destruição. Nem todo caminho antigo é bom porque é antigo. Nem todo conselho de avós, se justifica por ser do passado. Não basta ser velho, há de ser bom.
Mas qual seria esse caminho? Uma dica: talvez não seja nenhum dos que nós trilhamos, mas sim aquele trilhado por quem nos amou primeiro. Busque, ache e guarde como um tesouro.
Alguém que trilhou o bom caminho da confiança de forma completa foi Jesus. Ele se colocou não como mestre distante, mas como escravo sob o mesmo jugo que nós. Como tal Ele disse: Olhe! Aprenda de mim que sou manso e humilde. Coloquem sob si o jugo do mesmo modo que eu o coloco. E verão que em mim, acharão descanso. E você viverá. Assuma um coração aprendiz e veja o que acontece.
Hoje como naqueles tempos de “fim de feira” do Profeta Jeremias, chega-se à mesma triste conclusão: Mas vocês não querem!
Bem, se assim for, pouco se pode fazer, mas e se você desejar e se você tomar a decisão de parar na encruzilhada, talvez descubra que você seja um só. Nesse caso, fique com a frase que tenho usado, tanto baseado nas convicções que tenho quanto na paz oriunda de saber-se no caminho certo: “Eu sei que sou um só, e eu sei que um só pode muito pouco, mas o que um só pode fazer, isso eu farei”.
Claudio Oliver (via Na Rua com Deus)
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