quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Cabeça de Abóbora

Este texto, “Cristão Cabeça de Abóbora” foi compilado para educar os cristãos sobre o verdadeiro sentido do Halloween. Para sua leitura, são bem-vindos todos aqueles que mantêm a cabeça clara e o espírito aberto. Aqueles com ‘cabeça de abóbora’ definitivamente não estão convidados. Não pretendo ser contra o Halloween, tampouco quero compartilhar o culto à morte e a exaltação de coisas monstruosas ou feias que traz consigo, pois é próprio dos cristãos celebrar o triunfo da vida e promover a beleza e o bem. Se é o dia dedicado a todos os santos, vamos celebrar a santidade e não o dia das bruxas. Melhor santos, que abóboras ocas. 

Por isso, frente às fantasias dos mortos-vivos que enchem as ruas das cidades no dia 31 de outubro, devemos transmitir outra mensagem: a vida é bela e sua meta é o céu; são muitos os que já chegaram e todos somos chamados a compartilhar sua felicidade, pois todos podemos ser santos.

Não creio que haja algo de ruim que as crianças vistam uma fantasia, vistam-se de vaqueiro ou de Cinderela e peçam doces de casa em casa. É uma diversão saudável. O perigo está nas fantasias que glorificam deliberadamente o mal e infundem medo, ou quando as pessoas pretendem “conseguir poderes especiais” através da magia e da bruxaria, inclusive por um simples entretenimento.

No livro do Deuteronômio, o capítulo 18, fala de não tentar consultar os espíritos dos mortos, nem os que pratiquem feitiços, bruxaria ou atividades como estas. Isto seria uma violação de um mandamento, seria colocar outras coisas antes da relação com Deus. E esse seria o perigo do Halloween. Que de alguma maneira Deus se perca em tudo isto, que a conotação religiosa se perca e, finalmente, as pessoas glorifiquem o mal.

É importante recordar que o diabo e os espíritos malignos não têm nenhuma autoridade adicional no Halloween, embora pareça que sim. O diabo atua no que as pessoas fazem, ele não faz algo por si mesmo. Talvez pela forma em que celebram esse dia, na verdade esteja convidando o mal para entrar em nossas vidas. Uma das melhores coisas que os pais podem fazer é aproveitar o Halloween como um momento de aprendizagem e para explicar às crianças “por que certas práticas não conduzem a nossa fé e identidade cristã.

O Ano-Novo dos celtas, dois mil anos atrás, era em 1º de novembro. Para esse povo que habitava o que hoje chamamos de Irlanda, Reino Unido (e também França), o dia marcava o fim do verão e o começo do inverno. Em uma época em que as estações do ano determinavam os ciclos da agricultura com muito menos espaço para intervenções humanas que hoje, e que o sucesso das colheitas definia o tamanho da despensa das pessoas, a data era crucial. Nada mais justo que fosse escolhida para encerrar um ano e começar outro. Era o fim do período solar, vivo e encalorado e o início da longa, fria e morta treva. O inverno chegara.

Na véspera desse dia de mudança, a divisão do plano dos vivos e dos mortos se misturava. À noite de 31 de outubro, desprovida de cancelas fronteiriças entre os que aqui estavam e os que já se foram, eles deram um nome, samhain. No samhain, fantasmas dominavam a terra, destruíam plantações e causavam arruaças. Em contrapartida, a presença deles facilitava o trabalho dos druidas, os sacerdotes celtas, de fazer previsões. Profecias eram um abraço quente e necessário no tenebroso inverno que começava – não muito diferente do apego contemporâneo ao horóscopo todo começo de mês. Se os druidas previram, não conseguiram evitar a invasão de um povo mais poderoso e violento que os celtas, os romanos. Em 43, o império iniciou o domínio das terras que eles batizariam de Britânia. Nos quatro séculos seguintes, os costumes romanos se misturaram aos celtas. Feralia, uma festa em que Roma celebrava a partida dos mortos, realizada em fins de outubro, naturalmente se aclimatou no Norte e deu novas cores ao samhain. Outra festividade incorporada pelos nortenhos celebrava Pomona, deusa dos pomares, cujo símbolo, uma maçã, talvez explique em parte a antiga brincadeira de pegar maçãs com a boca.

As terras dos celtas seguiram como um lugar distante do centro do poder até que o próprio Império Romano se dividiu e, no Oeste, foi pulverizado. Em 13 de maio de 609, a Igreja Católica dava as cartas, e o papa de então, Bonifácio IV, oficializou um costume que os antigos cristãos no Oriente já faziam: honrar os mártires. Para deixar claro o recado, o papa pegou um antigo templo romano, o Panteão, e o dedicou àqueles que morreram por Jesus. O templo de todos os deuses romanos passou a ser o templo de todos os mártires. Mais tarde, outro papa, Gregório III, expandiu a festividade a todos os santos e mudou a data para 1º de novembro. Em 1000, a Igreja criou mais uma data nessa sequência de festas, e aí o 2 de novembro virou o dia para honrar todos os mortos. A escolha foi estratégica. A ideia é que a nova festividade substituísse o samhain nas ilhas celtas, onde a palavra de Jesus começava a se firmar. Assim, as paradas, fogueiras e fantasias de santos e demônios do samhain acabariam incorporadas por uma celebração semelhante e, mais importante, sancionada por Roma. Agora, a Igreja tinha um dia para todos os santos e outro para todas as almas, que no Brasil chamamos Dia de Finados. Ambos pegaram, mas o 2 de novembro não eliminou o 31 de outubro, apenas o fez mudar de nome e se adaptar. O Dia de Todos os Santos era chamado, em inglês, de “All-hallows”. A noite da véspera era, portanto, “All-hallows Eve”. O termo mudou com o tempo e acabou virando “Halloween”.

Na segunda metade do século 19, os Estados Unidos, que haviam sido colonizados por cristãos daquelas antigas terras celtas, receberam uma nova leva de imigrantes, especialmente da Irlanda, que sofria, na época, um bocado com uma crise de fome. Os irlandeses levaram na bagagem o ancestral costume do Halloween.

Ao longo das décadas seguintes, a festa ganhou novos contornos. O gesto de pedir comida ou dinheiro no dia de todas as almas na Inglaterra, em troca de orações para os mortos da família, deu origem ao “gostosuras ou travessuras”. Ao mesmo tempo, o senso de comunidade tirou espaço do medo real de fantasmas. Na virada para o século 20, o Halloween já tinha perdido boa parte do caráter supersticioso. As máscaras e fantasias, que serviam para enganar os espíritos, viraram apenas uma brincadeira para enganar, no máximo, um vizinho desatento. Deixar comida na porta de casa, que servia para afastar os fantasmas do lar, tornou-se uma forma de interação com a comunidade. Isso nos Estados Unidos. Outros povos comemoram as festividades à sua maneira.

No México, o dia dos mortos, tradição anterior à colonização espanhola, ganhou elementos cristãos e segue ainda hoje firme como uma das festas mais famosas do mundo. Austríacos decoram túmulos de entes queridos com lanternas. Filipinos cantam de casa em casa pelas almas do purgatório. Chineses queimam pequenos botes de papel. Brasileiros levam flores ao cemitério, aproveitam o feriadão para pegar trânsito na estrada e, mais recentemente, incorporaram o Halloween americano – algo que não é exclusivo. Até a França, tão protetora da cultura local, começou a adotar a festa da abóbora decorada nos anos 90.

Já a origem do símbolo da abóbora está ligada à lenda de Jack O’Lantern. Existe uma antiga lenda irlandesa, em que se conta de um homem chamado Jack que tinha sido tão mau em vida que supostamente não podia nem entrar no inferno por ter enganado muitas vezes o demônio. Assim, teve que permanecer na terra vagando pelos caminhos com uma lanterna, feita de um vegetal vazio com um carvão aceso. 

As pessoas supersticiosas, para afugentar Jack, colocavam uma lanterna similar na janela ou à frente de sua casa. Mais adiante, quando isto se popularizou, o vegetal para fazer a lanterna passou a ser uma cabaça com buracos em forma do rosto de uma caveira ou bruxa. 

Jack, um alcoólatra grosseiro, em um dia 31 de outubro bebeu excessivamente e o diabo veio levar sua alma. Desesperado, Jack implora por mais um copo de bebida e o diabo concede. Jack estava sem dinheiro para o último trago e pede ao Diabo que se transformasse em uma moeda. O Diabo concorda. Mal vê a moeda sobre a mesa, Jack guarda-a na carteira, que tem um fecho em forma de cruz. Desesperado, o Diabo implora para sair e Jack propõe um trato: libertá-lo em troca de ficar na Terra por mais um ano inteiro. Sem opção, o Diabo concorda. Feliz com a oportunidade, Jack resolve mudar seu modo de agir e começa a tratar bem a esposa e os filhos, vai à igreja e faz até caridade. Mas a mudança não dura muito tempo, não. No próximo ano, na noite de 31 de outubro, Jack está indo para casa quando o Diabo aparece. Jack, esperto como sempre, convence o diabo a pegar uma maçã de uma árvore. O diabo aceita e quando sobe no primeiro galho, Jack pega um canivete em seu bolso e desenha uma cruz no tronco. O diabo promete partir por mais dez anos. Sem aceitar a proposta, Jack ordena que o diabo nunca mais o aborreça. O diabo aceita e Jack o liberta da árvore. Para seu azar, um ano mais tarde, Jack morre, e em seguida tenta entrar no céu, mas sua entrada é negada. Sem alternativa, vai para o inferno. Chegando lá, encontra o diabo, o qual ainda desconfiado e se sentindo humilhado, também não permite sua entrada, e como castigo, o diabo joga uma brasa para que Jack possa iluminar seu caminho pelo limbo. Jack põe a brasa dentro de um nabo para que dure mais tempo e sai perambulando. Devido a esse acontecimento, sua alma penada passa a ser conhecida como Jack da Lanterna.

Os nabos na Irlanda eram usados como "lanternas do Jack" originalmente, mas quando os imigrantes vieram para a América, eles descobriram que as abóboras eram muito mais abundantes que nabos. Então começaram a utilizar abóboras iluminadas com uma brasa por dentro ao invés de nabos. Por isso a tradição de se fazer caricaturas em abóboras e iluminá-las por dentro com uma vela na época de Halloween.

Halloween, Dia de Todos os Santos e Dia de Finados são a evolução de eventos realizados por diversos povos, que aproveitavam a mudança de estação para lembrar a brevidade da vida e honrar os mortos. Por mais que a origem tenha se desvanecido na história, nós não somos tão diferentes quanto os celtas que faziam festa quando o calor dava lugar ao frio. Até começo de horário de verão é uma boa desculpa do calendário para beber.

O saci-pererê retratado por Monteiro Lobato em 1917 era chifrudo e tinha dentes pontudos para sugar o sangue de cavalos. Lendas mais antigas do curupira falam que ele não tinha ânus. A mula-sem-cabeça original tinha cascos afiados. Os três assassinavam quem cruzasse seu caminho. A cuca era uma velha horripilante que capturava crianças, nada daquela bruxa-jacaré trapalhona do Sítio do Pica-pau Amarelo. O negrinho do pastoreio era um pobre escravo, amarrado ensanguentado em um formigueiro. Um folclore rico, sanguinário e mais carismático do que imaginamos. O Dia do Saci nasceu na década passada como uma resposta à crescente popularização do Halloween no Brasil. Mas o Halloween, diferentemente do que muito se propaga, não é uma festa unicamente americana e pagã. É uma mistureba com elementos dos antigos celtas, de romanos, de irlandeses e ingleses da Idade Média e dos primeiros séculos de tradição cristã.

Se o Halloween é o resultado de 2 mil anos de adaptações e evoluções, está mais que na hora de o saci maluco invadir a festa do vampiro importado. O Halloween marcava a mudança de estações. 

E nisso um Halloween brasileiro levaria vantagem. Não é o inverno gélido e decrépito que bate à porta. É o verão.

O Halloween é, sem dúvidas, uma cerimônia de menor relevância na cultura brasileira. No entanto, a pergunta de muitos permanece: um cristão deveria participar de uma festa de Halloween? Creio que alguns princípios podem nos orientar a fim de respondermos essa pergunta:

Em primeiro lugar, antes de participarmos de qualquer celebração cultural, é imperativo que investiguemos suas origens e desenvolvimento histórico. Conhecer a história do Halloween, Natal, Festas Juninas, entre outras, nos ajudará a formar uma opinião mais sólida e sem preconceitos sobre tais temas;

Em segundo lugar, não podemos negar que a antiga festa cristã que celebrava a vida dos mártires, “All Hallows Eve”, nada tem a ver com o atual Halloween, caricaturado por bruxas, caveiras e feiticeiros. Mesmo assim, seria ir longe demais considerar pecado colocar uma fantasia, acender abóboras ou pedir doces de casa em casa — com exceção das travessuras. Errado seria fazer isso sem conhecer o que há por trás destas coisas ou mesmo participar de algum tipo de cerimônia ocultista.

Em terceiro lugar, parece que a maioria das pessoas participa da festa porque, como acontece na festa junina, é mais um evento cultural do que religioso. No Halloween a maior parte das pessoas, especialmente as crianças, só querem doces por causa dos doces e as famílias decoram a casa mais por uma questão cultural que religiosa.

Em quarto lugar, como cristãos, o Halloween é uma boa oportunidade para as igrejas ensinarem o que realmente compreendemos sobre a vida após a morte, isto é, que as almas dos mortos não podem retornar para o nosso mundo e apenas Cristo nos dá o poder de vencer a morte. Nesta perspectiva, qualquer festa cultural pode ser usada como ponte para ser proclamada a verdade do Evangelho, ainda mais para aqueles que tiveram uma origem distintamente cristã.

Em quinto lugar, como cristãos protestantes, ao invés de investirmos nosso esforço para redimir uma festa que já se tornou um folclore bem confuso, poderíamos canalizar nossa energia em celebrar a Reforma protestante, no mesmo dia 31 de outubro, pois nesta data vemos como a leitura da Palavra trouxe vida para um mundo escuro e cheio de confusão.

Que todos sejam sal na terra (Mt 5, 13-14), e que este sal tenha a virtude de não deixar a identidade cristã desnaturar-se mesmo num ambiente duramente secularizado. Este é o caminho, ser luz pela ação do Espírito Santo no mundo, assim como também exorta Paulo: “Não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, a fim de conhecerdes a vontade de Deus: o que é bom, o que Lhe é agradável e o que é perfeito” (Rm 12,2). 

Trata-se de uma moda que, no entanto, tem sérias implicações não apenas no âmbito consumístico. A grande maioria dos jovens, que organizam festas a fantasia nessa ocasião, são vítimas inconscientes tanto da moda quanto daqueles que, a todo custo, devem vender produtos comerciais manipulando realidades espirituais. Vejo que o fenômeno é tão irracional que se torna a real cifra da sociedade contemporânea: quem não acredita na verdade termina por acreditar em alguma coisa, até mesmo nas abóboras! Estou ciente, no entanto, que em alguns casos estes tipos de manifestações tenham origens ocultistas e até mesmo satânicas e, portanto, alimentá-las e não as corrigir pode transformar-nos em inconscientes alimentadores daquela “fumaça de satanás”, que já intoxica muito o mundo. Todos devemos ter cuidado para não respirar fumaças tóxicas; as vezes isso acontece quase inadvertidamente. Lembremos que uma abóbora, ainda que abençoada, sempre será uma abóbora. Aquelas do dia das Bruxas nem sequer são abençoadas!

Que resplandeça a santidade e não as abóboras ocas próprias do Halloween. Na noite de 31 de outubro, recordemos o senhorio de Deus em seus santos, o triunfo da luz sobre a escuridão. Que nesta noite não haja espaço para a escuridão.


Fontes:

Revista Super Interessante - Felipe Van Deursen;
https://pt.zenit.org/
http://ultimato.com.br/

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