segunda-feira, 14 de outubro de 2013

O que Jesus não carregou na cruz


“Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido” (Is 53.4).

Há algum tempo li numa revista o relato sobre um casal da Filadélfia (EUA) que confiou na cura pela fé: “Seu filho faleceu sem ajuda médica”. A justiça considerou os pais culpados de homicídio por imprudência. Um leitor comentou:

No movimento pentecostal mundial existem muitas igrejas que pregam doutrinas semelhantes às da “Igreja do Evangelho do Primeiro Século” da Filadélfia (a igreja do casal citado), ensinando que “doenças estão relacionadas à falta de fé e são sempre do Diabo”. Essa doutrina é falsa e irresponsável. Pode ser, sim, que Deus permita ou queira que um cristão morra de alguma enfermidade. (...) Quem sempre fica falando de cura e é incapaz de curar, deveria mandar os membros da sua igreja ao melhor médico que conhece.1

O Senhor Jesus não carregou nossas enfermidades na cruz. Que argumentos existem para embasar uma afirmação tão “ousada”?

1. Os resultados

Se Jesus tivesse carregado nossas enfermidades na cruz, os resultados deveriam ser obrigatoriamente os mesmos da salvação. Mas não é o que acontece. Quando alguém se converte a Jesus, a conseqüência direta é o perdão pleno de todos os seus pecados, recebendo imediatamente o Espírito Santo e nascendo de novo – sua alma e seu espírito ficam curados. Mas seu corpo também é curado imediatamente? E é sempre curado? Não! Exceções confirmam a regra, mas Deus é soberano, e graças a Ele por isso – mas por que uma pessoa não fica curada sempre, mesmo tendo sido salva? Porque a carne não pode ser salva e por continuarmos vivendo em um corpo pecaminoso, suscetível a todo tipo de doença.


2. A própria Palavra de Deus explica

Mateus 8 descreve o Senhor curando um leproso. Depois Ele cura o servo de um centurião romano de Cafarnaum. Aí vem a cura da sogra de Pedro. E nesse contexto está escrito: “Chegada a tarde, trouxeram-lhe muitos endemoninhados; e ele meramente com a palavra expeliu os demônios e curou todos os que estavam doentes; para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías: Ele tomou as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças” (Mt 8.16-17). Assim, Jesus cumpriu a profecia de Isaías 53 ainda antes de Sua crucificação, durante Sua vida e Seu ministério terrenos, quando curou muitos dos Seus compatriotas judeus, compadeceu-se deles, tomou sobre Si as suas dores e sarou-os. Ele sofreu com seus sofrimentos, teve compaixão deles e carregou suas fraquezas e doenças. Essa profecia foi cumprida, primordialmente, em Israel e com relação a Israel, e foi uma prévia do futuro reino messiânico.

No Novo Testamento, sempre que lemos que algo foi cumprido, isso significa completa e plenamente, sem necessidade de um cumprimento posterior ou final. Vejamos alguns exemplos do Evangelho de Mateus, onde, a cada evento, está escrito “para que se cumprisse”:

- Mateus 1.22-23: o nascimento virginal.
- Mateus 2.15,17-18,23: a fuga para o Egito, a matança dos inocentes em Belém e Jesus ser chamado de Nazareno.
- Mateus 4.14-16: a profecia sobre Zebulom, Naftali e a Galiléia dos gentios.
- Mateus 13.14-15,35: a cegueira dos fariseus e o falar em parábolas.
- Mateus 21.4-5: a entrada triunfal em Jerusalém, montado em um jumento.
- Mateus 27.9-10: a traição por trinta moedas de prata e a compra do campo do oleiro.

Todas essas profecias não terão um cumprimento futuro, uma vez que já estão cumpridas. A exatidão da Bíblia a respeito fica evidente no dia de Pentecostes. Quando este aconteceu, não está escrito que era o cumprimento da profecia de Joel, “mas o que ocorre é o que foi dito por intermédio do profeta Joel: E acontecerá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei o meu Espírito sobre toda carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos jovens terão visões, e sonharão vossos velhos; até sobre os meus servos e sobre as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e profetizarão” (At 2.16-17). Por que Pedro não usa a palavra “cumpriu”? Porque Pentecostes ainda não era o cumprimento definitivo e final dessa profecia de Joel. Ela ainda está em aberto e espera seu cumprimento final, que se dará quando Jesus voltar. É o que vemos também em João 19.36-37: “E isto aconteceu para se cumprir a Escritura: Nenhum dos seus ossos será quebrado. E outra vez diz a Escritura: Eles verão aquele a quem traspassaram”. No versículo 36 a Escritura está cumprida; no versículo 37 ainda não, uma vez que essa parte é futura, o que explica a diferença na afirmação.

Essa análise do assunto é muito importante, para que classifiquemos as afirmações da Escritura da maneira correta, sem forçar seu conteúdo e seu contexto e para que não sejamos insensatos ou nos fixemos em algo sem sustentação bíblica e que acabará por nos deixar frustrados. Tantos vivem um cristianismo tenso porque são levados a crer que precisam ser curados de qualquer maneira. Dessa forma, muitos enfrentam os maiores problemas quando a cura não vem. O Novo Testamento fala de sofrimento físico em muitas passagens. E os cristãos não estão isentos dele; pelo contrário, são exortados a suportar os sofrimentos com ânimo e coragem.

“Ele tomou as nossas enfermidades” significa que, durante Sua vida terrena, Jesus tirou as doenças de muitos. Mas não está escrito que Jesus estivesse com AIDS, hepatite ou câncer quando estava dependurado na cruz, como se chega a afirmar.


O que Jesus carregou na cruz

Quando a Bíblia fala da cruz ela nunca diz que Jesus carregou nossas enfermidades, mas o pecado, que Ele tomou sobre Si – que é a causa da enfermidade e da morte. Só em Isaías 53.5, e não no versículo 4, a profecia fala da cruz e do que Jesus carregou na cruz: “Mas ele foi traspassado (na cruz) pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados (das nossas transgressões). Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, cada um se desviava pelo caminho, mas o Senhor fez cair sobre ele a iniqüidade de nós todos” (Is 53.5-6). “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Co 5.21).

Nós, seres humanos, somos enganados e marcados por uma postura interior equivocada. Pensamos, agimos e fazemos de conta que a doença é pior do que o pecado. Em geral, a enfermidade é considerada o que existe de pior. É por isso que desejamos “saúde!” uns aos outros ou dizemos que “o mais importante é a saúde”. Mas existe algo que é muito pior do que toda e qualquer doença: o pecado. É o pecado que nos mata, não a doença. O pecado é a causa de todas as doenças, a raiz de todo sofrimento e da morte. É terrível sofrer e morrer de alguma doença, mas imensuravelmente pior é morrer em pecado.

Para que não haja nenhum equívoco, quero deixar bem claro: cremos que Deus faz milagres ainda hoje e cura pessoas; cremos que devemos orar por elas. Mas como em todos os assuntos, a fé na cura deveria estar embasada na Escritura como um todo, para que não sejamos levados pelo engano.


Norbert Lieth 

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