terça-feira, 19 de julho de 2011

Henoc: O Homem que andou com Deus

Chega até nós, vindo não se sabe  de onde, um sussurro, um chamado débil, uma premonição de que existe uma vida mais rica, e sabemos que a deixamos de lado. Cheios de tensão em face do ritmo louco de nossas tarefas diárias, a pressão é ainda maior em decorrência da inquietação interior, porque percebemos insinuações de que há um estilo de vida imensamente mais rico e profundo do que toda essa existência apressada. Existe uma vida repleta de serenidade, paz e poder, sem pressa.

Perto da igreja onde ministros nos períodos de divulgação nos EUA, há um cemitério muito antigo. Várias vezes resolvi deixar o gabinete pastoral e dirigir-me àquele cemitério. Você pode achar que isto foi estranho. . . mas enquanto passeava por suas ruas ía lendo as inscrições nos epitáfios, procurando imaginar como tinha sido a vida daquelas pessoas, suas alegrias, tristezas, famílias, carreira profissional . . . e como teria sido suas vidas em relação a Deus. Depois passei a pensar sobre a minha própria vida. O que eu gostaria que as pessoas soubessem a meu respeito após minha morte? Quem fosse ao cemitério e visse meu epitáfio, o que iria ler? Pensar nisto não é algo tão estranho, pois, o próprio Salomão mencionou que tal exercício é algo salutar para o homem (Ec 7.2).

Recentemente visitei um outro cemitério. Este, porém, se encontra na Palavra de Deus. Nele descobri que há sim esperança para pessoas que, como eu, desejam viver uma vida mais profunda e de verdadeiro significado. Este cemitério se encontra em Gênesis 5.1-31.

Quando entramos neste cemitério encontramos um resumo da vida de várias pessoas. Na primeira quadra está o túmulo de Adão e seu epitáfio diz: “viveu ao todo 930 anos e morreu” (Gn 5.5). Mais adiante encontramos o de Sete e o dele diz: “viveu ao todo 912 anos e morreu”(Gn 5.8). Continuamos andando e encontramos os túmulos de Enos, Cainã, Maalaleel e Jarede. Em todos estes as palavras se repetem: “viveu tantos anos e morreu”.

Mas de repente encontramos um túmulo diferente: em vez de encontrarmos o triste refrão “e morreu”, encontramos um sepulcro que diz, “Enoque andou com Deus”: “Aos sessenta e cinco anos, Enoque gerou Matusalém. Depois que gerou Matusalém, Enoque andou com Deus trezentos anos e gerou outros filhos e filhas. Viveu ao todo trezentos e sessenta e cinco anos. Enoque andou com Deus; e já não foi encontrado, pois Deus o havia arrebatado” (Gn 5.21-24).

Enoque e Elias são os únicos homens que a Bíblia menciona que escaparam da morte, pois Deus os tomou para si. O sepulcro de Enoque está vazio. Isto aponta para nós que há uma esperança, há, de fato, uma vida mais profunda e cheia de significado—não precisamos passar pelo ciclo vicioso de vida e morte, podemos andar com Deus! Por trás das nuvens negras da morte brilham pelo menos três raios de esperança para todos nós.

I. Quem anda com Deus descobre o verdadeiro sentido da vida. 

Deus havia dito a Adão que sua desobediência acarretaria em sua morte. Porém, 900 anos se passaram e eles ainda estavam vivos. O leitor de Gênesis 1 a 4 poderia perguntar: será que Satanás tinha razão ao afirmar que certamente eles não morreriam com sua desobediência? O capítulo 5 vem comprovar a veracidade da advertência divina. “E morreu...” “E morreu...” “E morreu...” Ninguém escapa. A morte é a triste realidade da conseqüência natural do pecado.

Morte é o tema deste capítulo. O fato é que a morte nunca foi o plano de Deus para este mundo. Nos capítulos de 1 a 3 vemos Deus como um bom Pai, com filhos e filhas, feitos à sua semelhança, feitos para serem abençoados, com vida e com comunhão constante e amorosa. Porém, seus filhos caíram debaixo da maldição da morte por desobediência. A morte passa a reinar devido ao pecado. Aqueles que foram feitos para viver são agora destinados para morrer, voltando ao pó, vítimas da serpente que agora também come pó.

A partir de então a vida pareceu perder seu sentido de ser. O homem entrou num ciclo de nascer, crescer, gerar filhos e morrer. E este ciclo torna-se monótono, vez após vez, oito vezes, pessoa por pessoa, até chegarmos ao versículo 21.

De repente, algo inédito acontece. Uma quebra dramática da narrativa é feita. Enoque não “morreu”, ele andou com Deus e Este o levou. Enoque não “viveu”, ele “andou” com Deus. Andar com Deus está um nível acima do simples viver. O texto destaca duas vezes o andar com Deus para mostrar que a vida de Enoque foi a exceção no meio de homens que viverem sem sentido e isto faz brilhar para nós um raio de esperança. Não precisamos nos entregar a uma vida insignificante. O segredo de uma vida significativa é um andar com Deus.

Enoque rompeu o ciclo vicioso, achou significado na vida muito acima de seus contemporâneos. Viveu como luz e sal da terra. Era ele uma pessoa que inspirava esperança, um verdadeiro raio de esperança em meio às trevas do pecado. Ele voltou a andar com Deus, mesmo estando fora do jardim, como Adão e Eva. E hoje Jesus nos propõe a mesma coisa: segui-lo para andar na luz e ter comunhão com ele (Jo 8.12;32).

II Quem anda com Deus dirige sua vida pela fé.

Como poderemos romper os ciclos de mera existência de nascer, estudar, casar, trabalhar, ter filhos, aposentar e morrer? Em outras palavras, como vamos andar com Deus em cada uma destas etapas da vida e transformá-las à luz da presença eterna e santa de Deus?

A vida de Enoque nos traz a resposta. Ela nos mostra a graça de Deus no meio de um dos capítulos mais tristes da Bíblia. Ali a marcha fúnebre pára de vez, e só ouvimos as cordas da vitória. Para escapar do aguilhão da morte, precisamos andar com Deus pela fé. Embora o autor não explique aqui o significado de “andou com Deus”, descobrimos mais tarde o que implica.

Enoque não atingiu este ideal de vida pelos seus próprios esforços; mas, sim, pela fé. Conforme o autor de Hebreus, viver pela fé foi para Enoque seu segredo para estar com Deus (Hb 11:5,6). A maior prova de nossa fé ser verdadeira é o andar com Cristo (Tg 5.13-14). Enoque tinha um Deus tão grande e um “eu” tão pequeno que a única opção para ele foi viver na sombra deste grande Deus. Ele não confiava em seus próprios pensamentos, sonhos e planos (Jr 17.9), mas, sim, confiava que Deus existe e que galardoa aqueles que andam com ele. Acreditava que valia a pena andar com Deus e nele confiar, apesar das pressões de sua sociedade pecaminosa.

O verbo hebraico que é traduzido em português como “andar” (Gn 5:21) traz a idéia de “passear para cá e para lá”, sempre na presença de Deus. É o mesmo usado para descrever Adão e Eva no jardim. Também foi usado para Abraão em Gênesis 13.17 quando Deus o mandou examinar a terra prometida de uma extremidade a outra. Significa viver todos os momentos, tomar todas as decisões, avaliar todos os pensamentos, consultar em todas as dúvidas o Criador do universo.

Ninguém anda com Deus puxando-o como uma criança puxa o pai para ir à loja de brinquedos. Não somos “colegas” de Deus. Na verdade, é Ele quem nos dirige, guia e direciona e, nós, apenas o seguimos. Quem quer andar com Deus pela fé precisa entregar a escolha para Ele, ir aonde Ele vai e fazer o que Ele faz.

III Quem anda com Deus deleita-se com os presentes que recebe das mãos amorosas do Pai celestial.
Jean-Pierre de Caussade afirmou:

A vida dos que se abandonam em Deus é sempre misteriosa. Recebem presentes excepcionais e miraculosos, entregues através das experiências mais comuns, naturais e casuais, nas quais não parece haver nada extraordinário. O sermão mais simples, a conversação mais banal, o livro menos erudito, tudo é fonte de conhecimento e sabedoria para estas almas, graças ao propósito de Deus. É por isso que, cuidadosamente, eles recolhem as migalhas que as mentes brilhantes menosprezam, porque para eles tudo é precioso, uma fonte de enriquecimento.[ii]

 Tal é a experiência daqueles que andam com Deus. Enquanto os que vivem sem Deus procuram saciar sua sede de sentido para a vida em coisas estranhas, aqueles que andam com Deus pela fé  se  deleitam com os detalhes mais rotineiros de sua vida, pois neles descobriram que o que Paulo disse é verdade: “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus...” (Rm 8.28). A presença de Deus ilumina cada detalhe de nossa vida e nos torna pessoas satisfeitas. Podemos agradecer a Deus pelo café da manhã, louvá-lo por nossa saúde, ser gratos pela blusa que vestimos no inverno... tudo isso porque Deus está conosco e sentimos seu amor nestes detalhes pequenos de nossa  vida.

A presença de Deus não apenas trará sentido para os detalhes da nossa vida, mas por meio dela deixaremos um legado para nossa família. Matusalém, filho de Enoque, viveu até o ano do dilúvio e viveu mais do que qualquer outro homem na face da terra. Isto nos mostra que ele aprendeu com seu pai o que significava, primeiro, obedecer a Deus e, segundo, honrar aos pais (Ef 6.3). Noé, bisneto de Enoque, foi o único salvo juntamente com sua família no dilúvio. Com certeza aprendeu o temor a Deus porque aprendeu de sua família o que significava honrar a Deus.

Pode haver presentes melhores do que estes? Sentido para vida que traz contentamento e felicidade e também um legado para a família que leva nossos descendentes para mais próximos de Deus? Só isso bastaria para desejarmos andar com Deus, mas, há mais um presente ainda: a vida eterna. Um dia Enoque e Deus estavam passeando, como de costume, quando de repente Enoque olhou para o relógio, viu que era tarde, e disse: “Deus, é muito tarde, preciso voltar para casa”. Porém Deus lhe respondeu: “Enoque, parece que estamos mais próximos hoje de minha casa. Que tal você pernoitar comigo hoje?” E Enoque nunca mais voltou. Da mesma maneira como ele, nós também podemos ganhar a vida eterna por meio de Jesus. Cristo afirmou:

Em verdade, em verdade vos digo: Quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida . . . E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste. (Jo 5.24, 17:3).

Hoje o mundo oferece uma série de coisas para dar sentido à vida: dinheiro, fama, tecnologia, drogas e sexo. Porém, aprendemos com Enoque que para o homem descobrir o verdadeiro sentido de sua vida basta ele se voltar para seu Criador e “andar com Deus”. Sua vida então deixará de ser “terrena” e passará a ser “celestial”.

Há muitas coisas que poderiam ser escritas no meu sepulcro, mas acho que descobrimos neste texto a melhor de todas. “Ele andou com Deus”. Se você ou eu morrêssemos hoje, seria isso o que as pessoas falariam a nosso respeito?

Que esta seja a descrição da sua e da minha vida. Deus nos convida para justamente este tipo de comunhão constante com ele. Somente andando com o Senhor é que realmente “viveremos” e não apenas  “existiremos” como seres criados por Deus. Pr. David Merkh

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